Se já é difícil comandar esse sistema chamado
escritório, em que o trabalho é recompensado com dinheiro, imagine administrar
uma roça onde a única certeza do "funcionário" é levar umas
chicotadas nas costas. Pois era exatamente essa a missão de um fazendeiro nos tempos
do Brasil escravagista - desafio para deixar qualquer diretor de recursos
humanos de hoje com os cabelos em pé.
Para resolver o problema, uma série de senhores de
engenho e missionários se dedicavam a escrever manuais sobre como lidar com
escravos. Algumas dessas "dicas" estão no recém-lançado livro Feitores
do Corpo, Missionários da Mente (Companhia das Letras), do historiador Rafael
de Bivar Marquese. É uma bela chance de entender a lógica hedionda de um
sistema que se baseava em trabalhadores tratados como animais, mas que
precisavam ser administrados e estimulados como eram - seres humanos. As
questões "banais" do dia-a-dia de um escravocrata incluíam
desenvolver as melhores técnicas para evitar fugas, açoitar mulheres sem
despertar a ira dos homens ou descobrir que raios fazer com crianças que ainda
não tinham idade para trabalhar.
Feitores revela os dilemas que cada grupo
enfrentava na hora de aplicar suas idéias. Religiosos insistiam na educação
cristã dos cativos. A metrópole colonizadora se preocupava com o abastecimento
de novas "peças". Senhores se esmeravam em explorar ao máximo seus
subordinados. Desnecessário dizer: a única coisa que não entrava em pauta era
acabar de uma vez por todas com a escravidão.
REPRODUÇÃO
Problema: Manter a oferta de escravos
quando abolicionistas pressionavam pelo fim do tráfico
Solução: Em 1803, o inglês Dr. Collins
bolou um "bônus" para negras que engravidassem: pelo primeiro filho,
a mãe seria dispensada dos trabalhos no campo. O segundo valia uma folga
quinzenal. O terceiro, folga semanal. Pelo quarto, dois dias de descanso. Pelo
quinto, três e pelo sexto filho, finalmente, ela se tornaria uma pessoa livre.
A prole, é claro, ficava na senzala
CONTROLE DE FUGAS
Problema: Evitar fugas de escravos
Solução: Castigar fujões era um bom remédio, mas não o único
nem o que trazia melhores resultados. Mais eficiente era permitir que os
cativos criassem porcos ou galinhas e cultivassem roças ao lado da senzala. O
senso de propriedade despertava a fidelidade: quem se arriscaria a trocar o
certo pelo duvidoso e perder os bens fugindo para o matagal bravio?
ALIMENTAÇÃO
Problema: Controlar os custos com a alimentação
Solução: Ser mesquinho não era bom negócio - cativos
famintos roubavam para comer. Melhor para os senhores era reservar semanalmente
1 quilo de farinha e 900 gramas de carne salgada por escravo. A distribuição
não deveria ser feita aos domingos, o dia de visitas, quando escravos ofereciam
aos convidados o que tinham para comer. O ideal era distribuir a ração nas
segundas-feiras
CASTIGO
Problema: Punir mulheres sem revoltar os homens
Solução: Nunca açoitá-las em público. O melhor era bater
nelas dentro de casa, longe da ira masculina. Os "machos", porém,
sofriam castigo exemplar: convocava-se a escravaria, o infrator era colocado
numa carroça e chicoteado à exaustão. Em seguida, os senhores passavam pimenta,
sal e limão nas feridas para aumentar a dor e evitar pústulas ou inflamações
DESCANSO DE DOMINGO
Problema: Manter os escravos ocupados nos domingos, os dias
reservados ao Senhor
Solução: Um escravista verdadeiramente devoto a Deus não
podia obrigar seu plantel à labuta nos domingos. Mas isso não significava lazer
à vontade. Da alvorada até as 10h, os negros deviam lavar roupas e limpar a
senzala. Depois, frequentar a missa, para se tornarem cristãos e caridosos. Só
após o jantar estavam liberados para festas e brincadeiras - com a cachaça
correndo por conta da casa-grande
CRIANÇAS E ESCRAVAS
Problema: O que fazer com as crianças?
Solução: Até os 5 anos, as crianças deviam ser nutridas com
arroz, caldo de carne e mingau. Dos 5 aos 10 anos, os infantes recebiam leves
tarefas de trabalho. O objetivo: fortalecer os músculos e moralizar o espírito.
"Somente" aos 10 anos é que eram expostos a serviços mais pesados,
que davam retorno ao bolso dos senhores
Nossa! Preciso conhecer esse material por completo. http://oficinadahistoriapb.blogspot.com.br/
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